Lamentavelmente, ainda viceja na sociedade humana o hábito atávico de se imaginar, vezes sem conta, que há preces, ainda que proferida com sentida emoção, não sejam ouvidas pelos destinatários.
Ledo engano cometem aqueles que agasalham esses pensamentos, porquanto todas as preces são ouvidas, sim senhor, sem distinção sempre são ouvidas, mas não atendidas de imediato, por óbvias razões, seja pela natureza do pedido, seja porque o tempo do Senhor da Vida, não se conta na ampulheta das criaturas, sem que isso iniba as rogativas de chegarem ao departamento celeste, recepcionando as súplicas endereçadas ao Eterno, ou a seus arautos do bem.
Sob o manto dessa verdade, a ninguém será lícito pré-julgar, acreditando-se imerecida o seu pleito. Anote-se por isso, os pensamentos de William Shakespeare, poeta, dramaturgo e ator inglês, que cunhou incontáveis frases para a viagem evolutiva das criaturas, algumas delas, essa pena pincela com o objetivo de sedimentar a narrativa em apreço, como por exemplo:
“É mais fácil obter o que se deseja com um sorriso do que à ponta da espada”; “Sofremos muito com o pouco que nos falta e gozamos pouco o muito que temos”, sem olvidar a imorredouro axioma popular, nascido de suas reflexões mais profundas quando afirmou que: “Existem mais mistérios entre o céu e a terra do que possa imaginar a nossa vã filosofia”.
Estabelecido o prólogo que irá argamassar os propósitos da filosofia popular em relevo, vê-se com clareza que apesar das preces, vez que outra não serem atendidas, no tempo ou no modo desejados pelos necessitados, apesar dos pesares, tudo está certo em nome do amor do Pai Celestial, porquanto não se desconhece que o Criador sabe o que faz, compreendendo-se que Ele é onipotente, onisciente e onipresente e, em tempo não muito longo se descobre que há razões que as próprias razões desconhecem para esse proceder, no silêncio que muito explica, conhecendo o é melhor para as suas criaturas, porque Ele jamais se engana.
Sob o pálio dessas considerações, sabe-se que as criaturas do Divino, quando resignadamente, diante de ocorrências desairosas, ou que sintam frustrado os planos lhanozos de esperança, para a obtenção do sucesso no projeto anelado, uma vez tendo cumprido retamente os seus deveres, aceitam os desígnios de Deus.
Para isso expressam o axioma popular com a resignação do “apesar dos pesares”, demonstrando assim, o seu entendimento as soberanas Leis do Eterno, conscientes de que nada acontece por acaso, mas por uma causa, podendo ser o aprendizado da virtude da paciência ou aceitação da lição sublime de Yehoshua, esclarecendo que apesar das aflições no carreiro das provas, Ele venceu o mundo.
Existe a propósito do tema em apreço, uma antiga lenda norueguesa, relatando que o zelador de uma capela num pequeno e distante povoado dessa terra abençoada, sempre olhava para a cruz onde o Homem de Nazaré estava pregado, representado os acontecimentos transatos e pensava consigo mesmo na injustiça que fora praticada ao Raboni; tratava-se da criatura chamada Haakon e todos os dias ele via muita gente adentrar na ermida para orar com devoção, frente aquela cruz infamante e muito antiga.
Ocorreu que, certo dia o encarregado da igrejinha, impulsionado por um sentimento de generosidade, ajoelhou-se diante da cruz, imitando os fiéis, fez uma sentida prece ao Crucificado, dizendo: Senhor, desejo padecer por Vós. Deixai-me ocupar o Vosso lugar. Oh! Meu Deus.
O Senhor da cruz, como se fosse um milagre representado pelo miraculoso, disse: Amigo, posso atender a tua rogativa, mediante uma condição. Admirado, perguntou o homem de bom coração, qual é Senhor? Diga, estou disposto a cumpri-la. O diálogo prosseguiu, dizendo então o peregrino do amor:
Escuta-me. Aconteça o que acontecer, não importa o que ouça ou vejas, terás que guardar sempre absoluto silêncio. O homem bem-intencionado resoluto respondeu: Eu prometo, Senhor.
Desse modo foi realizada a troca, sem que ninguém percebesse. O tempo passou e o substituto do Crucificado vinha conseguindo cumprir o seu compromisso de ver e ouvir calado.
Entretanto, certo dia, um homem rico foi até a capela orar e ao sair, esqueceu a sua bolsa sobre um dos bancos. O homem bondoso viu e se calou. Da mesma forma, nada disse quando, duas horas depois, alguém que também viera orar, encontrou a bolsa e valendo-se da oportunidade a levou para si.
Cumprindo a palavra empenhada o substituto da cruz infame, também permaneceu calado, quando um rapaz veio pedir as graças dos céus antes de empreender uma longa viagem.
Ocorreu, entretanto, que o homem rico das espórtulas, se deu conta de que esquecerá na igrejinha a sua bolsa e retornou em busca de suas moedas ali esquecidas, mas, como não mais as encontrou, imaginou que o rapaz que ali se encontrava teria se apropriado delas. Irrefletidamente, voltou-se para o jovem e o interpelou, com raiva, exigindo que lhe devolvesse o que lhe pertencia.
Na contenda, surpreso, defendia-se o rapaz dizendo, não peguei nenhuma bolsa, ao que retrucava o rico senhor exasperado, mentiroso, e investia-se furioso contra o rapaz no intuito de agredi-lo. Foi quando o homem substituto na cruz, intercedeu na contenda para pacificar os acontecimentos.
Entretanto, nesse instante inusitado, uma voz forte soou na intimidade da modesta capela dizendo em alto e bom som: Para! E a imagem autentica utilizou o verbo do amor defendendo o jovem e censurando o rico pela falsa acusação.
Ah, sim, os espectadores, assustados e admirados com o episódio, adotaram o seguinte procedimento: o rico deixou o local envergonhado e arrependido enquanto o jovem assustado diante do surreal acontecimento e porque tinha pressa para empreender a sua viagem, saiu em seguida, deixando a ermida vazia; Jesus aproveitando-se da oportunidade do silêncio, dirigiu-se ao servidor do templo e lhe disse:
Desce da cruz. Não serves para ocupar o Meu lugar. Não sabes ver e ouvir em silêncio sem julgar, e este justificando-se, trocou de lugar e o Cristo de Deus, modelo e guia da humanidade, conclui:
Tu não sabias que era conveniente para aquele homem perder a bolsa que trazia ao preço de muita maldade. Quanto ao rapaz, que iria receber alguns golpes, benção divina da Potestade, causaria feridas, mas o teria impedido de fazer a viagem que, para ele, foi fatal. Faz uns minutos seu barco soçobrou e ele se afogou. Tu não sabias, mas, Eu sabia, por isso me calo e não julgo, relembrando o “Não Julgueis”.
Não resta dúvida que na lenda há lição pedagógica escrita no silêncio das respostas, o porquê de muitas preces, ou o retardo nas das comunicações endereçadas ao Criador, tem sim, um significado para que se cale também e espere o tempo do Eterno, sem julgar, ciente de que há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha a vã filosofia.
Inegável sob esse arrimo, que há ainda criaturas do Eterno, em trânsito pelas provas, albergando sentimento de que suas preces não mereçam a atenção do Altíssimo, sem se darem conta da onipotência, onisciência e onipresença do Senhor do Universo.
Nessa ignorância, própria do momento evolutivo dos filhos do Altíssimo, ainda não sabem fazer o silêncio mental, calar a voz articulada ou os pensamentos, como propõe a narrativa da lenda norueguesa articulada no apólogo em comento.
É, pois, preciso saber calar as reclamações, esperar o tempo do Divino, ou os trâmites necessários a elevação dos viajantes das estrelas, dando tempo ao tempo, para que tudo aconteça como no planejamento Divino.
Inegável, pois, que nada absolutamente, nada é por acaso, mais por uma causa, razão porque não será licito as criaturas olvidarem, o caminho para os esplendores celestes, porque o Pai Eterno, sabe o que é melhor para os seus filhos e de todos cuida com amor, “apesar dos pesares”, como responde os venerandos mensageiros do bem na questão nº 963 de “O Livro dos Espíritos”.
Desse modo, a correta exegese do viajante da felicidade, sobre o tema em exame, na grande viagem da vida, sinaliza a confiança no Criador, de tal sorte que não se julgue a ninguém, apreendendo a esperar.
Sim esperar, porque o Eterno tem o seu tempo e sabe o que é melhor para cada um de seus filhos; em nome dessa razão impõe-se às criaturas serem indulgentes, humildes e amorosas, selando os compromissos assumidos na cruz da esperança, as lições do Divino Rabi da Galileia, fazendo brilhar a sua luz interior, de tal sorte que vendo e ouvindo, saiba calar-se, não se atrevendo a julgar, pois desconhecendo os motivos do “apesar dos pesares”, tudo está certo na Justiça Divina em nome do Seu infinito amor.
Adotando esse proceder, se afastam os que caminham em busca da felicidade, do muito que existe ainda na sociedade contemporânea, com procedimentos exibicionista e de imitação, seja na vestimenta, seja nos modos de proceder, permitindo brilhar a luz da vaidade e do orgulho, para exibir virilidade, figura austera a que todos no tálamo conjugal primam-se por obedecerem.
Nesse arrimo, não se negue também, que sobre o mesmo princípio, há homens e mulheres esforçando-se nas academias, não em busca da saúde física, mais para serem as mais belas ou belos, cobiçados, imaginando-se por isso, que jamais a solidão os envolverá em seus inevitáveis abraços. Meu Deus, que ledo engano que o tempo se encarregará de corrigir muitas vezes com dores acerbas.
Oxalá a mensagem do “apesar dos pesares”, em nome do amor eterno do Senhor do Universo, seja o Zênite e o Ômega, arrimo para manter por todo o sempre, os tesouros no coração constituindo o diferencial das criaturas em busca em si mesma, sua origem para conhecer a verdade, e a verdade os libertará, como Jesus exortou, porquanto o viajor saberá de onde vem, para onde vai e qual o propósito da vida, bela, colorida e consentida.
Nesse sentir d’alma, segue votos de um final de semana de muita paz, com o ósculo depositado em seus corações com a oblata da fraternidade, anelando se possa ajudar sempre os irmãos de caminhada, mais do que imagina a rasa filosofia, bastando para isso ter olhos para se ver e o espírito desperto para sentir que são Deuses, filhos da Consciência Cósmica.
Do amigo fraterno de sempre.
Jaime Facioli.